quarta-feira, 14 de outubro de 2015

As cores na areia me faziam mar

Submerso em meus braços, você
Não fazia força pra não tocar o chão
O olhar era torto
- O sentimento não

O cheiro salgado dos corpos cansados
Desenhava na areia do meu coração

Se sei o que fui – e muito sei disso
Me diz o que agora eu hei de não ser?

Se lhe rego de noite, no escuro
De dia me inundo
A tarde, seu mundo.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Em fim

Quando tudo era rosa
Fui feliz

Bocas e peles e olhares
- as curvas e danças das faces
O enfim


Mas foi quando da roupa fez-se nua
Que a face antes riso fez-se tua
Minhas as coxas antes curvas
Nossas palavras antes suas.

De repente, não mais que de repente.

Fosse eu Vinicius, amava.
Mas morre em mim o amor
como morrem as palavras

(Entre pronome e sentimento
Há apenas um momento).

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Desentristecendo

Língua d’água que bica o menino-pássaro
Fontes de despalavra alagadas de sol
Palivres de maneco
Longe 

Tábua negra que suga o pensamento-homem
Cálice amargo-doce de letras, de setas, de retas, de teras
Artesanato sóbrio de tempestades que não chegam
Desamadurecer 

Ler e não lembrar é um querer
Não chorar e escrever é precisar

sábado, 12 de outubro de 2013

Vigiar e Amar

A doença, a palavra, a crença
- crença não, a ciência
A palavra da ciência e a
Não ciência da palavra
- o fim da conversa.

A dominação invisível, impensável
De risadas afetadas, de portas fechadas
a leveza e a ingenuidade afável
- a boa vontade.

A determinação da certeza e a dureza do amor
- a curva (inevitável) da compreensão
Os abraços sinceros e a explicação
A doce e generosa normalização.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Névoas de um dia 20


Névoas no azul

Névoas de verde e amarelo
De aviões no chão
De bandeiras ao chão
Névoas de "contrarrevolução"

Névoas vermelhas de sangue
De uma foice não usada
De vitória não lutada
Névoas e águas passadas

Névoas que vem,
Névoas nuas
– pra quem as sabe enxergar
Névoas que nuvem.

Nuvens que passam
Verde, amarelo, azul, vermelho...


Arco e chuva na íris.

terça-feira, 17 de julho de 2012

(O sonho da) Realidade

Que direito é esse que nós pensamos que possuímos de mudar o outro?

Vejo tantos relacionamentos baseados em sonhos, consolidados em um futuro distante, alicerçados em promessas. Não falo só de casais: pais e filhos, avós e netos, irmãos.

Vejo o peso do olhar profundo e triste de quem carrega a expectativa: sempre uma pessoa-a-ser, nunca completa. A sombra de uma perspectiva alheia de perfeição dança em suas faces, escondendo lugares onde antes encontravam-se sorrisos e sóis.

Vejo também os traços retos e contraídos dos projetores: a ânsia tensa pela concretização a preencher espaços onde antes se espremiam confortavelmente a curiosidade e a admiração, os traços suaves.

 Eu vejo demais, mas sinto pouco.

Tendo sido projetor e projetado, sonhado sonhos pra alguns e dos sonhos de outros tentado escapar, lhes digo (a todos): ao hoje!

Ao hoje! Que os sonhos são nuvens que mudam, e ventam, e chovem.

À maior aventura da vida, a mais arriscada e difícil: viver no hoje sem a segurança dos sonhos, sem o castelo ou a fonte mágica a aguardar nossa chegada.

Ao bonito e ao feio, ao fácil e ao difícil, às qualidades e defeitos, às chegadas e às despedidas: ao hoje, agora.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Ninguém precisa de amanhãs

Às vezes eu acho que o "preço" da vida é durar tanto.

Tem gente que diz que ela é curta demais... curta demais pra que?

Em pouco mais de duas décadas já tenho tudo que eu podia desejar. Ou melhor, já tive, porque - em apenas duas décadas - essa tal de vida que-deveria-ser-curta já fez questão de me roubar alguns desejos.

Eu fui feliz. Tive amor de mãe, de pai, de avó. Muito amor de avó.

Tive desses amores de início de novela, em que tudo dá errado, e desses de fim, que não tem defeitos. Tudo o que sobra são peças do orgulho - conhecimento e reconhecimento.

E agora me resta esperar que a vida me leve os amores e me compense o orgulho. E eu espero. O que eu não vou, ao final, é suplicar uns minutinhos e lhe dar o gosto de dizer-se breve. Não vou.

Vivo o que viver, o hoje sempre me bastou.